Entrevista de Fabio Silveira para o Portal Varejo Em Dia.
É difícil encontrar comerciantes otimistas em um país com 13,7 milhões de desempregados, incertezas políticas, carga tributária elevada e com as maiores taxas de juros do mundo.
Se não está fácil faturar nesse ambiente, outro indicador, divulgado neste mês, sugere que os lojistas vão ter que rebolar ainda mais para vender neste segundo semestre.
O IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) de junho deste ano, de 1,26%, foi o maior desde 1995 para o mês de junho, quando bateu em 2,26%.
Uma inflação deste tamanho, como já se viu no passado, corrói demais o rendimento das famílias, de tal modo que fica impossível manter o padrão de consumo.
Nos últimos 12 meses, com os preços mais controlados, o rendimento das famílias teve aumento real de cerca de 2%. Uma inflação ao redor de 1% destrói metade do que se ganhou em um ano.
Se o cliente não compra, o comerciante não fatura e não compra da indústria. A economia cresce menos, gerando um círculo que provoca depressão da atividade econômica.
Para Fabio Silveira, sócio-diretor da MacroSector Consultores, o IPCA de junho revelou uma ruptura do padrão da inflação do país, o que é ruim para toda a economia.
Nos últimos 12 meses, a inflação estava na faixa de 0,30% a 0,35% ao mês. Em junho do ano passado, o IPCA foi negativo – deflação de 0,23%.
“Parte do mercado entende que essa alta de 1,26% do IPCA em junho não se repete em julho. Pode não se repetir, mas também não cai para os padrões dos últimos 12 meses”, diz.
Para Silveira, a inflação de julho deve ficar entre 0,6% e 0,7%, o que é considerada ainda muito alta, como reflexo do represamento de preços dos atacados durante a crise.
“1% de inflação ao mês corrói os salários de uma forma absurda”, afirma.
Se persistir, a inflação alta vai ter impacto significativo no PIB (Produto Interno Bruto).
No início do ano, os economistas mais otimistas projetavam crescimento de até 3% para o PIB neste ano. “Agora se fala em 1% para 2018 e 2,5% para 2019”, diz Silveira.
Alimentos e bebidas, transportes e habitação são três dos setores que estão mais pressionando a inflação. E são justamente esses com maior impacto no orçamento das famílias.
QUEDA DE BRAÇO
Com esse cenário, as negociações de preços entre as indústrias e os lojistas têm tudo para endurecer neste semestre, de acordo com Silveira.
De um lado existe a pressão das fábricas para repassar os reajustes dos combustíveis, da energia elétrica e de produtos que sofrem a influência do dólar, que está mais caro.
Na outra ponta está o lojista lutando para evitar reajustes de preços, até porque sabe que só consegue movimento maior na loja quando reduz os preços.
O fato é que, numa economia enfraquecida, geralmente, diz o economista, o varejo perde força.
“As negociações vão depender do setor e do produto. Se é algo essencial e há muitos fornecedores, o poder de barganha do varejo aumenta. Caso contrário, a força fica do lado da indústria”, diz ele.
Nelson Tranquez, sócio-diretor da Loony Jeans e presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas do Bom Retiro, diz que as confecções já sentem a pressão para a alta de preços das tecelagens.
As fábricas de tecidos aumentaram em 6% a 8% os preços neste ano. Há casos de reajustes na casa de dois dígitos.
“São poucas as indústrias de jeans com qualidade no Brasil. As confecções tentam buscar alternativas, mas nem sempre conseguem achar bons fornecedores”, diz ele.
O que deve se observar numa situação como esta de inflação alta, no caso dos alimentos, é o processo de downgrading de marcas. Isto é, a troca de marcas mais caras por mais baratas.
Para Silveira, o cenário econômico hoje no país, de qualquer forma, não é tão tenebroso como o dos últimos anos da crise, quando indústrias e fábricas tiveram de fechar as portas.
“No início do ano, os indicadores apontavam para uma melhora da economia, só que este horizonte ficou menos animador.”
CUSTOS E RECEITA
Para driblar esse cenário, que pode também piorar com a instabilidade política em véspera de eleições, os lojistas têm de ter sob controle custos e receita, ser criativo, ter bem claro os desejos do público que deseja atingir.
“Não adianta vender de tudo para agradar todo o mundo. É preciso identificar preferencias em alimentos, vestuário, eletrônicos, e estar atento ao que acontece no mundo, não apenas no mercado nacional”.
Para Silveira, os lojistas brasileiros são acomodados e pouco mobilizados para cobrarem, por exemplo, maior concorrência no mercado de crédito para o consumidor.
Ficam as dicas!