“A indústria da moda perdeu três anos. Só se recupera em 2023 “

A volta de eventos reaqueceu as lojas de roupas para festas, mas o setor de vestuário demora pelo menos mais um ano para chegar ao ritmo pré-pandemia, de acordo com estudo do IEMI

Por Fátima Fernandes (Jornal Diário do Comércio – Jornal das Associações Comerciais do Estado de São Paulo)

Um dos setores que mais sofreram com a pandemia, o de roupas para festa, comemora a volta dos eventos e, como consequência, dos clientes às lojas.

No Bairro do Bom Retiro, onde se concentram algumas dessas lojas, o movimento dos últimos meses fez alguns comerciantes até esquecerem dos quase dois anos sem faturar.

De setembro a novembro, a Lovissa, especializada em roupas para festas, vendeu, em determinados dias, até mais do que em igual período de 2019.

“A procura por roupas de festa voltou com tudo, o movimento está normal”, afirma Larissa Barros, vendedora da Madress, que comercializa vestidos de festa, localizada no Itaim.

O retorno dos eventos também reativou o mercado de aluguel de peças mais elegantes.

“A locação começou a melhorar a partir do final de outubro, mas não chega ao ritmo de 2019, até porque os eventos estão mais reduzidos”, diz Vera Lúcia Cícolo, sócia da D2K Vestidos.

O mês do Natal já começa, porém, frustrando as expectativas de lojistas. Assim que surgiu a notícia da expansão da variante Omicrôn, eventos voltaram a ser cancelados.

A Lovissa, que trabalha com vendas para o atacado e para o varejo, sentiu o efeito. “Lojistas começaram a postergar ou a reduzir os pedidos”, afirma Camila Cardoso, sócia da loja.

“Este mês está, de fato, mais fraco que os anteriores”, diz Larissa.

“Atualmente, atendemos entre 15 a 20 pessoas por semana para a locação. Antes da pandemia, eram entre 35 e 40 pessoas, semanalmente, ou até mais”, diz Vera Lúcia.

O vai e vem dos números não reflete somente a persistência do coronavírus por meio de variantes, de acordo com economistas e lojistas ouvidos pelo Diário do Comércio.

INDICADORES DESFAVORÁVEIS

Um dos mais importantes indicadores da força de uma economia está ruim. A renda disponível para as famílias neste mês do Natal deve ser menor do que a de 2019.

Em dezembro de 2019, a massa real de salários no Brasil foi da ordem de R$ 468,9 bilhões. Neste ano, a previsão é que chegue a R$ 447,8 bilhões.

Isto é, este valor é 4,5% menor do que o de dois anos atrás, e nele ainda está incluído o auxílio emergencial do governo.

Os cálculos são de Fabio Silveira, sócio-diretor da MacroSector Consultores, com base nos últimos dados divulgados pelo IBGE.

Na comparação com dezembro de 2020, de acordo com Silveira, a massa real de salários cresce 1,7% neste mês, mas por conta do aumento do número de ocupados, não de renda.

Em dezembro do ano passado, havia 86,2 milhões de pessoas ocupadas no país. Hoje, 93,8 milhões. Em dezembro de 2019, 94,5 milhões estavam ocupadas, de acordo com o IBGE.

“Não tem jeito, não vai ser um mês para o lojista estourar champanhe. E, sim, para abrir, no máximo, uma tubaína”, afirma ele.

Há outros indicadores ruins. A inflação e os juros em alta também levam os consumidores e, como consequência, os empresários, a serem mais cautelosos com as compras.

“O impulso dado ao comércio pela reabertura das lojas está se esgotando e as condições para o consumo, infelizmente, são desfavoráveis”, diz Fábio Bentes, economista da CNC (Confederação Nacional do Comércio).

Mesmo que a massa de rendimento cresça em relação a 2020, diz ele, a economia teria de crescer muito para compensar a pressão inflacionária que o país vive neste momento.

De cada R$ 100 que o consumidor recebe de recursos extraordinários, como o auxílio emergencial, geralmente, R$ 89 são usados para consumo imediato em até 30 dias.

Atualmente, diz Bentes, este valor é menor do que R$ 80 em razão do elevado endividamento das famílias e dos efeitos da inflação e dos juros em alta na economia.

“Este cenário provoca uma sensação de insegurança no consumidor, que fica com receio de colocar o pé no acelerador”, diz ele.

TRÊS ANOS PERDIDOS

De acordo com o IEMI, que monitora cerca de duas mil empresas da indústria têxtil e do vestuário, o setor de moda perdeu três anos com a pandemia e a situação econômica.

“A recuperação do setor vai ser lenta em 2022. O crescimento sobre 2019 deve acontecer somente a partir de 2023”, afirma Marcelo Prado, sócio-diretor do IEMI.

Neste ano, a produção de roupas no país deve chegar a 5,6 bilhões de peças, 12,6% maior do que a de 2020 (4,98 bilhões), mas ainda 5,6% menor do que a de 2019 (5,94 bilhões).

Em 2022, de acordo com as projeções do IEMI, o número sobe para 5,79 milhões de peças, mas somente em 2023 ultrapassa o número de 2019, podendo chegar a 5,99 bilhões de peças.

A mesma situação se repete no comércio de roupas.

Somente em 2023, o volume de vendas, estimado pelo IEMI em 6,55 bilhões de peças, ultrapassa o número de 2019, de 6,31 bilhões de peças, com crescimento de 3,8%.

Diante destes números, para Prado, 2022 ainda será um ano de grandes desafios para os empresários de moda.

Após estudar este mercado durante décadas, ele tem algumas sugestões para os lojistas, caso ainda não tenham colocado em prática ações para enfrentar a crise:

– Faça uma decomposição do mix de produtos;

– Analise a performance de vendas de cada categoria, ficando com aquelas com venda certa;

– Olhe para os nichos de mercado;

– Defina o perfil de seus clientes;

– Saiba a frequência com que os clientes vão às lojas, se residem ou não nas proximidades;

– Use as ferramentas disponíveis no mercado para se comunicar com os clientes;

– Não é obrigação ter e-commerce, mas use a internet para vender mais.

Muitas lojas do Bom Retiro e do Brás, diz ele, estão se virando muito bem com o WhatsApp.

IMAGEM: Fátima Fernandes/DC

Link para a matéria original